FORNICAÇÃO

Por que fazer de mim uma anátema.
Sempre admirei ás flores do jardim.
Pisava na grama com sutileza.
Abria bordéis sem machucar ninguém.
Encharcava minha alma por devaneios.
Queria ser um rei onde reinava o lixo noturno.
Tratava todos com absoluta igualdade.

Bebia cuba libre em copos de fel.
Era visto como um pajé.
Saciava o desejo de quase todos.
Compreendia o flagelo das noites.
Azedumes, humor cáustico - noctívago.
Ninfetas dilaceradas pela vida infame.
Compartilhava desta pintura incolor.

Rasteiras meninas e seus cafetões.
O negror possuía o ambiente.
Sujeira em profusão.
Não de almas, mas de corpos esquálidos.
Famintos e oportunistas.
Teatro dos horrores.
Cortinas mofadas e normalmente avermelhadas.

Ofereciam-se como mercado negro.
Verdadeiras escravas ao corpo alimentar.
Cada qual com suas penosas histórias.
Nunca contadas. Não havia tempo.
O tempo era medido por suas necessidades.
Um dia um mercador abastado às nutria.
Noutro a miséria ditava às ordens.

Pobres meninas. Corajosas mulheres.
Enfrentavam a ferro e fogo o coringa.
Quando do amanhã uma carta descartável.
Não sabiam da existência do alvorecer.
Jogadas num canto a morte por merecer.
Incrivelmente eram pessoas.
Talvez a vida  tenha sido muito cruel.

Codinome ao se apresentar.
Vulgo só para os íntimos.
Tornar-se próximo era uma dúvida ao ar.
Só na assiduidade, confiança ou considerar.
Mas o dinheiro fala mais alto, mesmo que em trapos venha embriagar.
São pobres meninas que procuram o afugentar.
Nas manhãs adormecem, para noites aguentar.

Também existe às que se adornam a perfumar.
Traem da mesma forma.
Todas são vítimas dos prazeres furtivos.
Profissão mais antiga do mundo. Dizem.
Mero detalhe dos perigos por enfrentar.
Nunca sabem do dia do amanhã.
Que pena - servas sem correntes, chaves por encontrar.

Perdidas ou não, a noite se vai.

Fornicatrices: mulheres que ficavam disponíveis próximas a pontes, arcos ou edifícios. Aliás, do termo fornix derivou a palavra fornicação (manter relações sexuais com prostitutas) .